Publicada em 21 de junho de 2002
O Estado de S. Paulo
EDUARDO NUNOMURA
Enviado especial
TÓQUIO – Quem vê Natsumi Nagashima, uma japonesa de 24 anos, alta para os
padrões orientais, vestindo roupas da moda, piercing nos lábios e com um
cabelo de cor avermelhada, pode imaginar que está diante de uma mulher de
estilo extravagante. Mas basta olhar para qualquer lado e constatar que ela
se veste diferente, mas é igual a tantas outras pessoas de sua geração. No
Japão, os jovens são parecidos uns com os outros, ainda que façam de tudo
para se diferenciar.
Cabeleireira, Natsumi gosta do estilo japonês de se vestir. É algo do gênero
“cada um na sua”, explica ela. Para escolher suas roupas, a jovem opta pela
chamada street fashion, um modismo que contaminou a juventude no Japão. A
maioria das lojas de roupa desse estilo é composta de grifes próprias com
inspiração ocidental, da cabeça aos pés. As grandes marcas da moda existem,
mas são usadas pelas pessoas um pouco mais velhas ou cujos empregos exigem
um traje mais comportado.
Nas ruas de Harajuku ou Shibuya e também no “Itchi-maru-kyu”, o grande
shopping center da juventude, há um verdadeiro desfile da fauna jovem.
Vê-se de tudo: cabelos pintados de loiro, vermelho, laranja, roxo e verde;
japonesas de olhos azuis, verdes e amarelos; sapatos de salto altíssimo;
peles extremamente bronzeadas natural ou artificialmente; óculos malucos e
roupas coloridas e sobrepostas umas às outras.
Vale de tudo para ser diferente. O resultado é uma cena em que convivem lado
a lado jovens vestidos de preto como se tivessem saído de uma festa gótica
com garotas que se fantasiam de colegiais. Ou onde se vê um japonês de
cabelo à Bob Marley conversando com adolescentes vestindo camisetas Hello
Kitty. Ou ainda uma japonesa com jeito de Madonna usando uma camiseta do
Snoopy e namorando um Elvis Presley nipônico com estilo de skatista. Enfim,
uma moda caótica que até inspirou Michael Jackson a incorporar alguns
símbolos como a sua luva branca.
“Apesar de tudo mundo querer mudar um pouquinho, o que está na moda acaba
prevalecendo”, diz a vendedora Ai Umehara, de 21 anos. “Aqui, temos uma
cópia do estilo americano, mas com um toque japonês.” Ela própria é um bom
exemplo desse modismo. Cabelos e olhos da cor de mel e um bronzeado
adquirido na Praia de Saipan, um paraíso natural da Micronésia, no Oceano
Pacífico.
“Não gosto desse tipo de mulher”, comenta o jovem Torada Ohashi, de 18 anos,
que opta pelo estilo hip-hop. Segundo ele, as japonesas que acabam ficando
com a pele muito escura se tornam artificiais. “Não entendo porque elas
querem ficar parecendo ocidentais se todo mundo sabe que não são.”
Depois da crise de 1997, os japoneses começaram a relutar em comprar
produtos importados dos Estados Unidos ou da Europa. Na época, a insegurança
em relação ao futuro e a crescente produção de itens japoneses da moda
ajudaram a impulsionar a street fashion.
Para se chegar a um look do que acham perfeito, os japoneses desembolsam
muito dinheiro. Quase US$ 500 por mês. É o que gasta, por exemplo, a
free-lancer Natsue Kondo, de 20 anos. Duas vezes por semana ela vai às
compras para renovar seu armário. Diz que não se influencia por propagandas
na TV ou revistas de moda como a Cutie, uma espécie de Bíblia desse público
jovem. Ela cria seu próprio estilo, que garante ter influência asiática.
“Não é americano, mas gosto da moda de lá”, admite.
Até bem pouco tempo, as estudantes colegiais no Japão não podiam se maquiar.
Todas vestiam o mesmo uniforme e iam com o rosto lavado. O cabelo não podia
ser pintado. Agora, tudo foi liberado, a não ser a roupa escolar. Mas mesmo
assim elas dão um jeito de chamar a atenção.
Ousadamente, levantam até a altura das coxas a saia que deveria ficar pouco
acima dos joelhos. São minissaias improvisadas. Tudo para ficar dentro da
moda.