Publicada em 27 de maio de 2002
O Estado de S. Paulo
EDUARDO NUNOMURA
Enviado especial
ULSAN – Houve quem chorasse ao ver os jogadores da seleção brasileira
desembarcando no Aeroporto Internacional de Gimhae, em Busan. Eram 17h35
(5h35 em Brasília) quando as portas do saguão se abriram e apareceram
primeiro Cafu, Vampeta, Juninho Paulista e depois os demais atletas do
Brasil. Assim, tão de pertinho, os craques que os coreanos só viam pela
televisão. Muitas fotos, alguns acenos, sorrisos e um ou dois autógrafos.
Foi assim que os heróis do sonhado pentacampeonato foram recebidos na Coréia.
Poucos, mas barulhentos torcedores “made in Brasil” foram ao Aeroporto de
Gimhae, na cidade vizinha a Ulsan. Enquanto esperavam o avião, um grupo de
onipresentes cinco gaúchos e uma família de brasileiros que moram na Coréia
tocavam o pandeiro, o bumbo e a corneta para chamar a atenção. Sambavam com
eles até: “Me diverti muito”, afirmou Kim Si-Ok, de 31 anos, que trabalha no
aeroporto. As televisões do país registraram tudo.
Enquanto isso, o grupo da polícia especial da Coréia fazia uma ampla revista
com cães farejadores. Mais de 50 homens com capacetes, trajes e armamento
dignos de uma versão moderna dos famosos Robocops formaram o corredor que
separaria jogadores da torcida e dos jornalistas.
Havia cerca de 200 pessoas à espera da seleção. Quando se abriram as portas
em falso, mas ali se via o rosto de Rivaldo, os gritos começaram por todos
os lados: “Rivaldo, Rivaldo! Ronaldo, Ronaldo!” Quando os jogadores, enfim,
saíram e atravessaram o corredor, os coreanos correram desesperadamente.
Queriam acompanhá-los.
A delegação nem presenciou um fato bastante curioso no saguão. Coréia do Sul
e França disputavam amistoso em Suwon e o jogo era transmitido pela TV. Gol
da Coréia e um corre-corre toma conta do saguão do aeroporto. Havia somente
um aparelho de TV numa parte isolada do saguão. Os coreanos, eufóricos com o
empate parcial – sua seleção perdia por 1 a 0 – abandonaram malas pela
extensão do corredor, deixaram as filas para compra de passagens e seus
assentos em um bar na área de desembarque para ver a repetição do gol.
Pulavam, erguiam os braços, corriam como se estivessem numa gincana para
chegar a tempo de se posicionar à frente da TV.
Todos dentro e o comboio de três carros oficiais, o ônibus vermelho da Fifa
de placas PA-7515 (numerólogos de plantão?!) e um microônibus seguiram em
direção a Ulsan. Carros da polícia abriram passagem no percurso. Os
jogadores só puderam ver algumas bandeiras do Brasil a partir de Sinbok
Rotary, na entrada da cidade. Passaram perto do Munsu Stadium, onde jogam
dia 3 contra a Turquia, e pelo campo de treinamento, o Mipo Field, antes de
chegar ao Hotel Hyundai. Nas ruas, muitos olhares curiosos e raros acenos.
Às 7h01, o ônibus chegou ao seu destino. Felipão desceu primeiro e recebeu
uma coroa de flores e cumprimentos do prefeito de Ulsan, Shim Wan-Gu. “Foi
diferente do que imaginava”, limitou-se a dizer sobre a recepção.
Mais emocionada estava Lee Joo-Hyang, uma bela universitária de 24 anos que
entregou flores ao técnico. “Entreguei buquês também para a Espanha e a
Turquia, mas houve uma grande disputa para ver quem entregaria o do Brasil.”
De tão nervosa, não dormiu algumas noites e sentiu o gostinho da fama: “Tive
até de dar autógrafos.” Em seguida, vieram os jogadores.
Ao fundo, uma batucada da claque coreana improvisava um “olê, olê, olê, olá,
Burazil, Burazil”. Alguns seguravam uma grande faixa com os dizeres “Brasil,
o país que vai ganhar a Copa pela 5.ª vez! Torcida brasileira dos cidadãos
de Ulsan”. O Hino Nacional foi tocado, mas logo interrompido enquanto a
claque insistia no bumbo. Uma dança típica coreana num canto do
estacionamento foi iniciada, mas os jogadores já avançavam para dentro do
hotel. Poucos devem ter notado. Todo o protocolo da cerimônia havia sido
quebrado.
Às 19h10, o prefeito Shim Wan-Gu subia com os jogadores para o 11.º andar,
onde foi preparado um coquetel de boas-vindas. Menos de dez minutos depois,
ele saía do elevador para ir embora. No saguão, a maioria de coreanos
esquecia do tumulto da chegada brasileira para assistir aos minutos finais
da vitória de 3 a 2 da França sobre a Coréia. Às 20 horas, em noite de lua
cheia (astrólogos?), o saguão do hotel só tinha jornalistas. E o time
brasileiro, isolado em seus andares, ganhava assim a sua privacidade exigida
em contrato. (Colaboraram Sílvio Barsetti e Wagner Vilaron)