Publicada em 17 de agosto de 2001
O Estado de S. Paulo
EDUARDO NUNOMURA
Quando Fernando Bochio nasceu, 24 anos atrás, os parlamentares de Brasília
já discutiam um tal de Código Civil, que ele só veio a conhecer há pouco
tempo. Vinte e seis anos passaram-se para que essa lei fosse renovada. Foi o
bastante para que Bochio se tornasse advogado. Especializado em causas
civis, ele considera “inconcebível” que um texto tão importante tenha levado
tanto tempo para ser atualizado.
Jovens advogados como Bochio ou estagiários de direito, com uma carreira
pela frente, não se iludem com o novo Código Civil, cujo projeto de
atualização foi aprovado anteontem no Congresso. “O direito é muito
dinâmico”, afirma Bochio.
Ontem à tarde, as advogadas Patricia Leite Passarelli Joyce, de 29 anos, e
Aliete Valentim, de 36, conversavam na frente do Fórum João Mendes Júnior,
na capital. Falavam de processos, mas não do Código Civil. “Ele já nasceu
torto. Há 26 anos, eu era uma criança. Não se falava em clone humano,
Internet, nem se imaginava tantas inovações”, diz Patricia.
Aliete vai na mesma linha de raciocínio: “Acho importante que tenhamos uma
reforma no Código Civil, mas que ela continue, evolua e acompanhe as
mudanças da sociedade.” As duas não escondem alguma decepção com o que foi
aprovado. “O novo código sedimentou o óbvio; não trouxe inovações”, conclui
Patrícia.
Cursando o 2.º ano de direito, Fabiano Carneiro Furlan, de 21 anos, vai com
freqüência ao Fórum protocolar processos. Mesmo sem a prática da advocacia,
ele considera o atual código “muito ultrapassado” e as inovações propostas
apenas confirmaram regras que já valiam de fato. “Mas não deixam de ser um
passo a mais.”
Para a estagiária Daniela Corrêa Lopes, de 18 anos, a sociedade evoluiu
muito nas últimas décadas, enquanto o Código Civil em vigor ficou parado no
tempo. Um exemplo é a regra que permitia ao homem “devolver” a mulher se ela
não fosse virgem. “Não dá para comparar uma menina de 16 anos do passado com
uma de hoje.”
Se mesmo com as inovações o Código Civil já nasce desatualizado, o que
fazer? Continuar a usar leis mais atuais e as milhares de jurisprudências,
aconselham os advogados Bochio, Patricia e Aliete. A técnica em
contabilidade Josefa Augusta Ramos da Silva, de 50 anos, desconhece o que
seja a nova lei aprovada. “Código Civil são processos leves, não são de
morte”, arrisca. Isso não a impediu, contudo, que fosse ao Fórum ontem para
reclamar um direito sobre um imóvel para uma prima. Afinal, ela conhece o
Código de Defesa do Consumidor.