Publicada em 12 de julho de 2009
O Estado de S. Paulo
Eduardo Nunomura
A Lua desbravada. Gente morando, trabalhando e vivendo nela. Visionários imaginavam que isso seria possível. Com Neil Armstrong, o primeiro a pisar no solo lunar, os sonhos se tornaram possíveis. A Nasa, agência espacial americana, sonha em voltar ao satélite até 2020 e realizar um voo tripulado para Marte até 2030. Mas, 40 anos depois do gigantesco salto para a humanidade, o homem só detém pouco mais do que a tecnologia para dar pequenos passos na Lua.
Falta tudo, a começar pelo dinheiro, para que o programa Constelação crie estações lunares e a vida por lá se torne viável. Não há atmosfera como a da Terra. As radiações solares são implacáveis e as variações térmicas impraticáveis para o corpo humano. A falta de gravidade faz o homem perder massa óssea. Extrair do solo lunar água e combustível não passa, hoje, de conjecturas. O que dizer então da ideia de que a partir do satélite o homem viajará para Marte e outros planetas?
A Nasa quer obter os US$ 35 bilhões de um plano instituído por George W. Bush, em 2004, para construir a nova geração de foguetes que levarão o homem de volta à Lua. “Eu não creio que tenha outra chance, mas não quero dizer que não estarei disponível”, brincou o astronauta Armstrong em uma rara entrevista à TV, há dois anos.
O presidente Barack Obama, mais preocupado com questões terrenas como a crise financeira, pediu ao Congresso que reavalie o programa Constelação. Quer reduzir custos, hoje estimados em US$ 150 bilhões – a mesma quantia gasta nos 11 anos do programa Apollo, que permitiu a 24 astronautas orbitarem o satélite. O tom das discussões até o momento desestimula a aventura lunar. No passado, os Estados Unidos gastavam 3,5% do Orçamento para o programa espacial, mas hoje não passa de 0,5%.
No plano das ideias, o programa Constelação prevê o desenvolvimento do veículo espacial tripulado Orion, dos foguetes Ares I e Ares V e do módulo lunar Altair. O Orion terá uma cápsula maior que a da Apollo. Em vez de três astronautas, seis viajarão nele, mas já se fala em compactá-lo para quatro passageiros. Será ainda o veículo que levará o homem até Marte, partindo da Lua. Ele trabalhará com o Altair. Este módulo permitirá que os astronautas realizem atividades por até sete dias na superfície lunar. Armstrong e Edwin “Buzz” Aldrin, na missão de 1969, permaneceram no Mar da Tranquilidade por apenas 2 horas e 10 minutos.
O veículo Orion será lançado pelo foguete Ares I, cujo primeiro voo estava previsto para 2013, mas foi reprogramado para dois anos depois. Com capacidade de levar até 22,7 toneladas, o foguete usará combustível sólido no primeiro estágio, como nos ônibus espaciais, e líquido no segundo – a mesma tecnologia do Saturn V, do programa Apollo. O Ares V transportará o módulo lunar Altair, com capacidade de carga de 186,9 toneladas na órbita baixa da Terra – mais que o Saturn V, que transportava 118 toneladas.
Desde 1981, o Space Shuttle é o principal programa espacial americano. Mas os ônibus espaciais vão se aposentar. Com a tragédia da Columbia, em 2003, quando morreram os sete astronautas a bordo, os Estados Unidos decidiram descontinuar o projeto. Só restam mais sete voos até o ano que vem. Por isso, a Nasa e as centenas de empresas fornecedoras apostam as fichas na volta do homem à Lua. Mas de 2010 até 2015 o império terá de admitir uma derrota cara para o orgulho americano: seus astronautas vão ser transportados até a estação espacial internacional (ISS) pela espaçonave russa Soyuz.
Muita coisa mudou desde a Guerra Fria, que gerou a corrida espacial vencida pelos americanos, cuja símbolo maior foram os passos de Armstrong na Lua. O astronauta Charles Bolden já constatou isso. Sabatinado pelos parlamentares, Bolden, que pode ser o primeiro negro a chefiar a Nasa, indicado por Obama, alertou: “Antes, se fosse a uma sala de aula e perguntasse quem queria ser astronauta, todos levantariam as mãos. Hoje, devo ver três mãos. Eles preferem os negócios.”
Nas escolas chinesas, as mãozinhas estão levantadas e agitadas com a chance de chegarem antes à Lua. Em 2003, Yang Lee Wei se tornou o primeiro astronauta da China, que tem dinheiro e um governo que impõe suas vontades. O país asiático já anunciou planos de novos voos até o satélite, levando robôs e veículos lunares. A Índia já mandou um homem para o espaço em 1982, e seu programa espacial possui cerca de US$ 1,2 bilhão. A Agência Espacial Europeia e o Japão também estão nessa nova corrida.
Mas os americanos não se dão por vencidos e neste momento investigam o satélite com a missão Lunar Reconnaissance Orbiter. O veículo não tripulado vasculha lugares seguros para futuros pousos, procura por recursos minerais e estuda como a radiação lunar afeta os homens. Tudo isso é possível por causa da evolução tecnológica das últimas quatro décadas. Para conquistar a Lua, o foguete Saturn V possuía muito menos poder computacional do que um aparelho de DVD atual.
Se o homem fincar um pé na Lua, ele estará criando condições inéditas. Nessas missões, o que se procurará é usar o satélite para testar novas tecnologias, operações espaciais e técnicas para reduzir o risco e habilitar os voos até Marte.
As esperanças de tornar esse sonho possível estão depositadas na monstruosa cratera da noite eterna, vizinha ao pico da luz eterna. Nesse buraco, incomparável por nunca receber a luz do Sol, pode haver depósitos de gelo. O solo lunar é rico em alumínio, ferro, hélio e oxigênio, mas escasso em hidrogênio. Se houver água – oxigênio e hidrogênio –, isso muda tudo. O homem terá à sua disposição farto combustível para transportá-lo para outros planetas e respirará à vontade.