Padre faz reforma habitacional e agrária

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Publicada em 2 de julho de 1997
O Estado de S. Paulo

EDUARDO NUNOMURA
SARUTAIÁ – Padre, fiquei sabendo que o senhor está dando uns terrenos e eu
estava precisando de um.
– Tenho um para você.
– Mas, padre, tem um problema: sou crente…
– Não, não, não tem nada disso. Não quero saber, você só precisa escolher a sua
terrinha!
O diálogo acima é verídico. O padre em questão é o italiano Cosimo Damiano
Corigliano, de 64 anos, vigário da única igreja católica de Sarutaiá, município
de pouco mais de 4 mil habitantes ao sul de São Paulo. Sem esperar ajuda de
políticos, empresários ou financiamentos de órgãos governamentais, Corigliano
compra área e faz reforma urbana e agrária na cidade.
Ele administra um mutirão para 320 famílias, que está sendo feito em 7
alqueires, comprados com dinheiro da Associação Comunitária e Social de
Sarutaiá, que o padre coordena. Ninguém pagou um centavo pelo lote. E os mais
carentes ainda recebem dinheiro para erguer as casas.
Em outros 15 alqueires, realiza a reforma agrária. Distribuiu chácaras de mil
metros quadrados a bóias-frias, pequenos produtores e quem tiver interesse em
plantar. No total, 294 famílias conseguiram um pedaço de terra, onde iniciam o
cultivo de café, milho, soja, feijão, hortaliças e outros produtos. “Sou contra
invasões de terras. “
Ex-pedreiro, ex-militar e formado em teologia e filosofia, o padre Corigliano,
que chegou ao Brasil há 30 anos, trabalha das 6h30 às 22 horas como um
verdadeiro peregrino. É ele quem cobra da prefeitura e do Estado as condições
mínimas para tornar seus projetos realidade. Vai atrás de pavimentação, luz,
água e máquinas.
Atualmente, supervisiona a construção das casas no futuro Jardim Francesco
dElia, onde o mutirão segue em ritmo acelerado. Por exigência do padre, cada
lote possui no mínimo 300 metros quadrados. “É para dar conforto. ” No contrato,
cada família compromete-se a construir uma casa de no mínimo 70 metros
quadrados.
No bairro, haverá creche, mercadinho, sacolão, farmácia e casa de material de
construção. Os terrenos também foram dados pelo padre Corigliano. Cada
interessado tem direito a um ou mais lotes de 300 metros quadrados. Para evitar
especulação, as famílias têm de erguer uma casa em seis meses e a venda fica
proibida por 15 anos.
Um dos critérios utilizados pelo padre para dar um terreno é bastante lógico.
Basta o interessado ajudar em um dos projetos da associação comunitária.
“Trabalhei ajudando os outros, tipo mutirão, por três meses; depois ele me deu
terreno e material para construir”, afirmou Orivaldo Sampaio, de 28 anos, o
evangélico do diálogo inicial. “Esse padre é bom demais. “
Há um ano e meio em Sarutaiá, o padre é mais conhecido até que o prefeito e
elogiado por onde passa. “Ele é o nosso braço direito, o carro-chefe do
desenvolvimento do município”, definiu o prefeito Isnar Freschi Neto (PPB).

Fiéis e ‘mão de Deus’ garantem projeto
Para poder comprar os terrenos, o padre Corigliano conta com a
bondade dos fiéis e uma “mãozinha” de Deus. Muitas pessoas ficam entusiasmadas
com seus projetos e contribuem sempre que podem. E o padre não faz diferença se
a doação for de centavos ou milhares de reais. “É Deus quem ajuda. “
A farmacêutica Suzana Rodrigues da Costa, de 32 anos, que cuida das finanças da
Associação Comunitária e Social de Sarutaiá, acredita que só um milagre pode
explicar como os recursos chegam até as mãos do padre. “Outro dia a gente
estava precisando de R$ 200,00 e aí veio uma pessoa que disse que queria
contribuir com o projeto. ” E assim o padre vai colocando em prática a reforma
urbana e agrária possível, sem violência. “Ele mudou a história de Sarutaiá. “
Para o bóia-fria Livino Barbosa da Silva, de 45 anos, que ganhou um terreno de
mil metros quadrados, a chácara foi providencial. Antes, ele pagava aluguel.
Hoje vive com a mulher e três filhos na área que recebeu, onde planta 268 pés
de café. “Às vezes, sobra um pouco e dá para vender. “
O caminhoneiro Luiz Afonso Vaz, de 41 anos, gastou cerca de R$ 12 mil, que
recebeu ao ser demitido do último emprego, para construir uma casa de 90 metros
quadrados. “Não dá nem para acreditar que ganhei o terreno. “

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