
É fácil reconhecer um frequentador do Villa Country. Quase todos andam traiados – como são chamados os que usam chapéu, bota, cinturão, calça jeans e camisa xadrez. O dono do negócio, Marco Tobal, 57 anos, prefere camisa lisa, sapato baixo e um cinto discreto. Seu filho mais velho, Marco Tobal Junior, 33, usa camiseta e tênis. Tobal pai, dono da maior casa de música sertaneja do país – e também do Espaço das Américas, ambos em São Paulo –, divide a paixão pelos sucessos de Michel Teló com os riffs de guitarra do Queen. Foi graças ao empresário paulistano que a banda inglesa fez no Brasil dois shows antológicos em 1981. É por esse episódio que vale a pena começar a história.
O primeiro grande concerto de rock no país reuniu, em duas noites, mais de 200 mil fãs de Freddie Mercury e companhia. Poucos minutos antes do primeiro show, o jovem Tobal, na época com 25 anos, sentia um frio no estômago e um medo do tamanho do estádio do Morumbi. Só se acalmou quando os músicos pisaram no palco e ativaram os 140 mil watts de aparelhagem. A princípio, o Queen tocaria apenas na Argentina. A banda até queria, mas não havia muitos brasileiros dispostos a enfrentar o desafio de promover um show do grupo por aqui. Tobal disse sim.
Na época, ele já era dono da Toco Dance Club, aberta em 1972 na Vila Matilde, zona leste de São Paulo. A casa noturna virou um referência para quem queria ouvir o que tocava na Europa e nos Estados Unidos. Durou 26 anos e foi uma das responsáveis por revelar o hoje consagrado DJ Marky. As festas de aniversário da casa, comemoradas na sede do clube Corinthians, reuniam 20 mil pessoas. Essa era a experiência de megaeventos para Tobal, que aos 17 anos organizou a festa de formatura do colégio e enxergou aí um negócio.
Filho do taxista Manoel, um chofer de luxo que desfilava com um Chevrolet 1953 por festas de casamento e aniversário, Marco Tobal era o mais novo de cinco irmãs e, de longe, o que fez mais sucesso. Seu pai morreu com 50 anos e não viu suas conquistas. A mãe, Ana Garcia Tobal, que no aniversário de 15 anos do caçula lhe deu uma carteira de trabalho, morreu em 1985.
Ainda jovem, Tobal passou a promover eventos para 300 a 500 estudantes universitários. Largou a faculdade de engenharia industrial na FEI, investiu em equipamentos de som e luz e descobriu que lucraria mais se alugasse espaços para 2 mil pessoas. A Toco surgiu em seguida, com capacidade para 5 mil frequentadores.
Quando o empresário argentino Jose Rota, promoter do Queen, o procurou, Tobal pensou: “Do ginásio do Corinthians para o estádio do Morumbi, o que podia dar errado? E ainda investindo US$ 200 mil por noite?”. Tudo. Mas deu tão certo que ele passou a trazer mais artistas internacionais: B.B. King (Palace), New Order (Ginásio do Ibirapuera e Olympia), A-Ha (Parque Antártica), Pet Shop Boys (Ibirapuera), Siouxsie and the Banshees (Anhembi). Percebeu que também podia promover turnês de artistas brasileiros, como Gilberto Gil, Legião Urbana, Lobão, Lulu Santos, Paralamas do Sucesso, Blitz e Plebe Rude.
Segura, peão
A década de 80 foi bem-sucedida. Tobal abriu outras duas danceterias em São Paulo, a Contramão e a Twist’s. O êxito empresarial lhe permitiu comprar uma fazenda em Junqueirópolis, no interior paulista, que o faria dar uma guinada na carreira. Nas viagens com a família para a fazenda, Tobal teve contato com as festas do peão de Marília, Tupã e região. Era época de Chitãozinho & Xororó, Leandro & Leonardo. No início dos anos 90, enquanto os shows sertanejos lotavam as arenas, a música eletrônica bombava nas danceterias de Tobal. A Contramão, no Tatuapé, foi fechada em 1992. Na última noite, mais de 3 mil frequentadores se recusaram a deixar a casa. Mas precisavam, porque ali seria inaugurado o Caipiródromo, novo negócio do empresário. “Foi um choque, mas meu pai teve um insight de enxergar além de seu tempo”, afirma o filho mais velho.
O sucesso do empreendimento foi imediato, mas, por desentendimento com sócios, Tobal fechou a casa em 1996. Com o espanhol Alejandro Figueroa, ex-dono do Olympia, montou o Grupo São Paulo Eventos. Foi a entrada do espanhol que fez o negócio decolar, reconhece Tobal. Os dois estavam tão obcecados em encontrar o local perfeito para abrir uma nova casa sertaneja que levaram cinco anos para achar o terreno de 12 mil metros quadrados na Barra Funda, que hoje abriga três palcos diferentes, restaurante, pista de dança, camarotes e centro de convenções.
“Tobal é o maior profissional da noite, empreendedor, trabalhador incansável, uma inspiração”, elogia o produtor musical da casa, Carlos Anhaia. O empresário recorreu a ele quando decidiu montar a primeira banda do Villa Country. O guitarrista e tecladista, que tocava num grupo de rock antes de migrar para o sertanejo, ouviu apenas um pedido do chefe: modernizar o ritmo. Incluiu, assim, um violino e um acordéon na formação. Surgia aí o estilo que faria as pistas sacudirem: o sertanejo universitário.
Para montar o negócio, Tobal, o sócio e seus filhos, já adultos e participando dos empreendimentos da família, percorreram o circuito Tennessee, Texas e Colorado, nos EUA. Encheram dois contêineires com lustres, móveis, cartazes e até um balcão de bar que atualmente decoram o Villa Country. “A proposta era atingir o público do interior que morava em São Paulo”, diz Tobal Junior, hoje à frente da parte operacional da casa. Seu irmão caçula, Thiago, é o gerente. Já o do meio, Vinicius, cuida de uma construtora de casas e condomínios do interior ao lado da mãe, Sandra.
Assim que foi inaugurado, em 2002, o Villa Country caiu no gosto dos frequentadores e também dos artistas, tornando-se um celeiro de novos talentos. “Cantar no Villa, para nós, é uma prova de que conquistamos o público jovem”, diz Bruno, parceiro de Marrone. A dupla sertaneja é presença frequente no palco principal da casa, onde há dois grandes shows por mês, sempre às quintas, com cachê de R$ 120 mil. No início da carreira, Jorge & Mateus tocavam no Saloon, onde cada dupla recebe R$ 2 mil por apresentação. Já Victor & Léo, hoje campeã de arrecadação em direitos autorais no Brasil, começaram tocando na Praça Sertaneja, um dos menores espaços do Villa Country, com cachê de R$ 400. Muitos artistas deram um upgrade na carreira depois de tocar no Villa Country – incluindo Michel Teló, Gusttavo Lima, Fernando & Sorocaba e César Menotti & Fabiano –, que recebe cerca de 40 mil frequentadores por mês.
“Eu sabia que a música sertaneja teria vida longa por causa das festas do peão. Elas movimentam a economia brasileira”, diz Tobal. “O Villa Country é um lugar de misturas, as pessoas entram e ninguém sabe quem é quem. Isso é bacana, dá o caráter de uma casa democrática.” Foram os sertanejos (ao lado dos padres Marcelo Rossi, Fábio de Melo e Robson) que ajudaram a fazer com que o mercado fonográfico brasileiro crescesse 8,4% em 2011, com faturamento de R$ 373,2 milhões. “As vendas do CD da Paula Fernandes, por exemplo, estão bem acima do que hoje se considera um lançamento de sucesso no mercado brasileiro”, afirma Paulo Rosa, presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Disco.
Tobal nunca para de pensar no próximo negócio. No ano passado, investiu na reformulação do Espaço das Américas, um galpão vizinho ao Villa Country com capacidade para 8 mil pessoas. Na reforma, que durou oito meses, foram retiradas as colunas da pista. Lá aconteceram recentemente os shows de Morrissey, Los Hermanos e o tributo à Legião Urbana com participação do ator Wagner Moura. Na inauguração oficial, prevista para o segundo semestre, o artista convidado é ninguém menos que Roberto Carlos. Outro empreendimento foi a abertura, em 2010, do Country Beer, uma versão reduzida do Villa Country em São Caetano do Sul. “A ideia é que esse seja um modelo para novas casas em outros estados brasileiros”, diz Tobal Junior. Ninguém segura a dupla Tobal pai e Tobal filho.