Publicada em 1 de abril de 2002
O Estado de S. Paulo
EDUARDO NUNOMURA
Enviado especial
BUENOS AIRES – Nada faz mais sentido na vida de Helena Rodriguez do que o
sonho de reabrir seu salão de beleza, fechado há poucos anos por causa da
crise. A cabeleireira trabalha agora para juntar créditos. À margem da
economia do país, Helena e milhares de argentinos só usam os tíquetes que
circulam nos chamados “clubs de trueques”, associações onde cada vez mais
pessoas trocam mercadorias sem precisar usar o dinheiro. Empobrecida, a
classe média da Argentina se rendeu a esse tipo de atividade.
Já são mais de 500 clubes de troca em quase todas as 24 províncias do país.
A lógica é simples: cada um leva seus produtos, troca por tíquetes e com
esses papéis compra outros que não tem. Há roupas, sapatos, peças de
decoração, bijuterias e comida. Oferece-se ainda serviços como assistência
jurídica e sessões de terapia.
Ao cortar cabelos no Club de Trueque do Barrio Norte, Helena, de 38 anos,
economiza tíquetes para comprar os produtos de que precisará para seu salão.
“O serviço não me dá só a alegria de continuar trabalhando, mas de ver
pessoas se ajudando”, diz.
Até dezembro, o clube de trocas do Barrio Norte recebia 300 pessoas. Hoje,
são mais de 3 mil. “Os clubes mantêm a economia viva no país”, afirmou Elsa
Colangelo, de 53 anos, encarregada da associação. Lá, cada um fixa seu preço
de acordo com a oferta e a procura. Segundo estimativas de economistas, a
atividade girou em torno de US$ 500 milhões no ano passado e há quase US$ 10
milhões em créditos em circulação.
A psicóloga Rosa Romero, de 46 anos, oferece sessões de terapia em grupo por
dois créditos. Sabe que não é o tipo de produto de primeira necessidade e
por isso vende também pães feitos com ingredientes orgânicos. Ontem, em
poucas horas, vendeu todo o alimento. “Nas palestras de introdução para quem
vai entrar no clube, dizem para pensar primeiro na comida, nas roupas e
depois o que se quer”, explicou.