Publicada em 20 de junho de 2002
O Estado de S. Paulo
EDUARDO NUNOMURA
Enviado especial
HAMAMATSU, Japão – O sushi e a feijoada, acreditem, são “primos” dentro da
culinária gastronômica mundial. O sashimi e o churrasco, idem. Pratos
típicos de seus países e de sabores nada parecidos, eles vêm conquistando
fãs dos dois lados do planeta. Em diversas cidades brasileiras, a presença
de restaurantes de comida japonesa é quase obrigatória. No Japão, o que
antes era um local voltado para atender só os dekasseguis está se tornando
lentamente uma referência também para os orientais.
“Vim comer bastante”, avisou a universitária Yoshino Kobayashi, de 19 anos,
fazendo questão de mostrar o tamanho de seu prato. Ela e um grupo de 40
estudantes da Universidade de Hamamatsu reuniram-se para jantar na PitStop
Grill, um empreendimento do ex-feirante Jorge Matoba, de 60 anos. Além da
churrascaria, ele é dono de supermercado, padaria, açougue e butique.
O exagero nos gestos de Yoshino tem uma explicação. No Japão, os pedaços de
carnes vendidas nos supermercados são menores que a palma da mão. Trata-se
de um item de luxo. Por isso, os olhos da estudante crescem só de ver as
peças de picanhas próximos ao seu prato. “São grandes demais!”
“É moda freqüentar um restaurante brasileiro. Os japoneses ficam emocionados
quando vêem aquele pedaço de carne na mesa”, explica a professora Jandyra
Maeyama, que reuniu o grupo de orientais na churrascaria. A maioria dos
japoneses acaba conhecendo o churrasco e a feijoada por meio de amigos ou
conhecidos.
A dona de casa Sugita Fusayo, de 40 anos, decidiu conhecer a comida
brasileira porque seus filhos falavam muito sobre ela. As crianças tinham
coleguinhas filhos de dekasseguis na sala de aula. “Antes só conhecíamos o
samba, o futebol, o carnaval e a bossa nova”, afirmou Sugita.
No Brasil, a comida japonesa foi introduzida pelos imigrantes que para lá se
mudaram décadas atrás. Além do sushi e sashimi, ensinaram aos brasileiros a
comerem com palitinhos o tempura ou o guioza. “A comida japonesa é bonita de
se olhar, mas a brasileira tem a sua tradição”, disse Sugita.
A proprietária do bar e restaurante Parati, Alice Teruko Takahashi, de 40
anos, ainda tenta acertar o cardápio, reduzindo a quantidade de sal, pimenta
do reino e gordura nos pratos. Teve, para isso, a assessoria dos poucos
clientes japoneses que freqüentam o lugar.
A feijoada do Restaurante São Paulo, o mais antigo da cidade, é outro
exemplo de adaptação. A gerente Luiza Tashiro, de 35 aos, evita o sal em
excesso na preparação do prato porque o paladar japonês não suporta. No
início do funcionamento da casa, só alguns poucos japoneses curiosos
entravam. Agora, já são metade dos fregueses, loucos por um churrasco ou uma
feijoada.
Numa das ruas de Hamamatsu, fica a Servitur Assessoria, onde é possível
comer um churrasquinho ou os pastéis, típicos das portas de estádio. Lá
também se vende produtos brasileiros, como o guaraná e o aguardante. Só que
são importados e, portanto, mais caros que os locais.
É por esse motivo que, na maioria das vezes, comer num restaurante
brasileiro no Japão está cada vez mais se tornando coisa para japonês. De
preferência bem de vida. Os dekasseguis só vão de vez em quando, sobretudo
nos dias de pagamento.