Publicada em 23 de fevereiro de 2003
O Estado de S. Paulo
EDUARDO NUNOMURA
Medidas simples, como lei seca e polícia nas ruas, têm reduzido a
criminalidade no Estado de São Paulo. Em Diadema e Itapecerica da Serra, a
violência vem caindo drasticamente desde 1999. Nos dois locais, não se bebe
nos bares depois das 23 horas. Já Embu tem a mesma lei, mas não a adota. Em
2002, o número de assassinatos caiu, mas a cidade continua líder no ranking
de mortes violentas. Quem passa por Cubatão rumo às praias também não
imagina que ali ocorram por ano 70 mortes a cada 100 mil habitantes – mais
que em cidades da violenta Colômbia. Rio Claro ainda se pergunta a razão de
os homicídios terem triplicado. Esses exemplos provam que as prefeituras
podem exercer papel decisivo quanto à segurança.
Diadema já foi uma espécie de patinho feio, uma terra sem lei. Até quatro
anos atrás, era a mais violenta das cidades paulistas. De lá para cá, o
índice de mortes violentas caiu 47,4%. Na capital, de 1999 a 2002, a redução
foi de 16,8% e no Estado, de 12,3%. Um dos motivos do sucesso de Diadema é a
lei seca, que reduziu em 20% os homicídios em toda a cidade – e não só nos
bares.
Em muitas áreas abandonadas pelo poder público, disputas são decididas como
em um faroeste. As estatísticas de Diadema comprovavam: 60% dos homicídios
ocorriam entre 23 e 4 horas, sempre ao redor de bares. Para uma cidade com 4
mil estabelecimentos do gênero, entre legalizados e clandestinos, era um
risco em potencial. Com eles fechados, a ronda policial tem uma preocupação
a menos. “Deixou de ser um foco de atenção, onde se concentravam homicídios
e brigas”, diz o delegado seccional Sérgio Abdalla. As mulheres também
agradeceram: viram a violência doméstica diminuir.
Fórum – A cruzada antiviolência teve início em 2000, num evento promovido
pelo Instituto Fernand Braudel. Decidiu-se criar um fórum mensal, que passou
a reunir representantes da prefeitura, das Polícias Civil e Militar,
vereadores e líderes comunitários e comerciais. O combate à violência
tornou-se prioridade. Hoje, a cidade tem um mapeamento completo dos delitos.
O prefeito José de Fillipi Junior, eleito prometendo saúde, emprego e
segurança, acredita que Diadema serve de exemplo para outras administrações,
inclusive as de seu partido. “O PT se abriu, vencemos o preconceito de que
falar de combate ao crime era coisa de partidos conservadores. Percebemos
que as políticas sociais não são suficientes para reverter um quadro crítico
rapidamente.” A prefeitura pretende, por exemplo, dobrar o efetivo da Guarda
Civil Metropolitana (GCM), hoje com 120 homens.
No segundo semestre, empresários vão custear a compra e a instalação de
câmeras de vigilância no centro e na periferia. O conselho de segurança
autorizou ainda a compra de um helicóptero para a Polícia Civil. Todos os
dias, Diadema realiza operações integradas em toda a cidade. Nasceram as
Operações Quadrilátero e Centopéia, com homens da PM e da GCM, para
apreender armas, motocicletas irregulares e drogas e prender criminosos.
O prefeito de Embu, Geraldo Cruz (PT), está convicto de que a violência não
será resolvida por decreto. Políticas de geração de emprego e melhores
condições de vida para a população pobre são mais eficientes, aposta. Cidade
turística, famosa pela feira de artesanato, possui um centro histórico
seguro. Seu entorno é, ao contrário, superpovoado. Lá, o crescimento
desordenado permitiu ao crime se infiltrar.
Policiamento – “Embu não cresceu, mas explodiu. E está na divisa de uma das
regiões mais violentas de São Paulo. Seria difícil não estarmos no meio
dessa violência”, afirma o prefeito. Na sua opinião, mortes em outras
regiões podem estar sendo “empurradas” para a cidade.
“Aqui vem ficando extremamente simples a lógica: brigou, eu mato. Vamos ter
de mudar a cultura de que o crime compensa”, diz o delegado seccional Silvio
Balangio Junior. Um dos motivos é a falta de policiais. A PM tem um terço do
número de homens recomendado e só em maio entrarão em atividade os 50
guardas civis.
Existe um plano municipal de segurança, atualmente na fase de diagnóstico
dos problemas e elaboração das ações. No campo social, a prefeitura tem 23
projetos. As vedetes são os programas de geração de renda e trabalho, como a
incubadora de cooperativas. O resultado, contudo, não é imediato. “São
problemas crônicos de 20, 30 anos atrás. É um processo lento para ser
revertido”, afirma Cruz.
A população sente as conseqüências. No meio da Favela do Inferninho, onde
ricos buscam drogas, crianças pobres procuram alternativas na forma de
livros. A Biblioteca Zumaluma é a exceção de uma realidade que se espalha na
periferia de Embu. “Queremos mostrar que há uma mudança e amanhã não vai ter
só moleque trabalhando no tráfico”, diz o músico César Mateus Rosalino, de
28 anos, o Vultão. A iniciativa não teve apoio da prefeitura, que só
ofereceu uma estante. Graças a uma associação do bairro de Santa Teresa, foi
possível transformar o local, antes usado como desmanche de motos, motel e
fumódromo. “Isso tudo se resume em abandono. O centro de Embu é bonito, mas
ninguém se lembra de ver a periferia, os guetos.”
Entre 1999 e 2001, Itapecerica da Serra oscilou entre as três primeiras
posições do ranking da violência. No ano passado, despencou para o 15.º
lugar. Com a troca do comando da PM na cidade, a prefeitura pôde pôr em
prática o policiamento nas entradas principais. Mesmo com poucos carros de
polícia, a sensação é de que o município é vigiado. Muito diferente de
quando os carros da GCM eram parados em blitze.
O Plano Diretor, concluído em 2000, contribuiu para tornar a administração
mais eficiente e próxima do cidadão. A cidade foi dividida em 15 núcleos. “A
segurança deixou de ser a principal reivindicação das subprefeituras”,
explica o prefeito Lacir Baldusco (PSDB).
CDP – O Estado vai construir na cidade um Centro de Detenção Provisória
(CDP). Em vez de reclamar, como outros prefeitos na mesma situação, Baldusco
tratou de comprar uma área de 70 mil metros quadrados ao lado do presídio.
Vai construir um pólo de segurança, com parque ecológico, galpão de
agronegócios, unidades do Corpo de Bombeiros e do Instituto Médico-Legal e
batalhão da PM. Quer garantir segurança para a escola vizinha. “Já
percebemos que, quando se faz uma ação efetiva, o crime migra. Isto porque
ele não vai ficar onde tem mais segurança.”
Em outubro, entrou em vigor a lei seca. Mas a prefeitura sabe que ações
desse tipo só terão efeito prolongado se forem criadas alternativas sociais.
Desde 1997, surgiram os Barracões Culturais da Cidadania. Servem de
referência para os moradores, oferecendo atividades de artes. E não no
centro, mas na periferia.