Publicada em 28 de junho de 2002
O Estado de S. Paulo
EDUARDO NUNOMURA
Enviado especial
YOKOHAMA – Se os brasileiros sentem um pouco do Japão no bairro da
Liberdade, em São Paulo, os japoneses parecem estar na China num pedacinho
da cidade de Yokohama.
Um número cada vez maior de chineses vem imigrando para diversas partes do
Japão à procura de emprego e melhores salários. Acabam formando comunidades
fechadas, onde os bairros no estilo Chinatown são o ponto de encontro e
apoio para essa população.
Hoje, os coreanos são o maior grupo de imigrantes no Japão. Mas não se sabe
até quando. Projeções indicam que até o fim desta década ou na próxima, eles
serão superados pelos chineses.
Inglória – É verdade que para muitos ocidentais diferenciar um asiático de
outro se trata de uma tarefa inglória. Um ouvido atento, contudo, perceberá
que o mandarim já é falado abertamente num trem em Tóquio ou nas ruas de
Kobe.
Não se trata apenas de turistas, mas milhares de trabalhadores que vão dos
operários de fábricas aos empresários bem-sucedidos, invariavelmente do ramo
de exportação.
As famosas lojas de “100 ienes” (“hyaku-en”, equivalentes às brasileiras de
R$ 1,99) são repletas de produtos “made in China”.
Nove em cada dez guarda-chuvas usados no Japão são chineses, assim como 80%
do chá-verde consumido ou 70% dos produtos esportivos. Isso sem falar na
maioria dos “hashis” (palitinhos) usados nas refeições.
A vendedora Zhou Fuli, de 39 anos, nasceu em Yokohama e é neta de
comerciantes pioneiros de Chinatown. Ela é uma “hwa chao” – ou chinesa que
nasceu em outro país.
Ao longo de sua vida, ela viu o bairro crescer e se renovar. “Os chineses
que estão vindo para cá agora querem ganhar dinheiro”, explica.
Aposentadoria – Há uma conta que todo chinês faz antes de emigrar em busca
de trabalho. Para cada dez anos de sacrifício no Japão, uma aposentadoria
garantida na China.
“Um salário de um operário ou comerciante chinês aqui é 20 vezes maior do
que na terra de meus avós”, diz Fuli.
No bairro Chinatown de Yokohama, o maior do país, os chineses acabam se
sentindo os donos do pedaço. Dominam 90% do comércio das mais de 350 lojas,
bares, restaurantes e hotéis espalhados numa área de 300 metros quadrados.
Trata-se de um conjunto de 22 ruas e avenidas e uma porção de pequenos becos
repletos de letreiros escritos em chinês. O mandarim é bem aceito, assim
como o japonês, já que metade dos clientes é do Japão, segundo a Associação
de Desenvolvimento de Chinatown.
Exótico e iluminado, Chinatown começou a ganhar a forma de um bairro em
1955, quando um portal no estilo chinês foi construído numa de suas ruas.
Hoje, é um grande centro comercial.
Há duas décadas no Japão, Yu Yu Long, de 48 anos, tem mulher e dois filhos
que o auxiliam na loja de chá Ten Ren. Ele pacientemente ensina os japoneses
a tomarem corretamente o chá chinês. “É difícil dizer o que penso deles.
Eles não são muito abertos para os estrangeiros”, afirma.
Superstição – No coração da Chinatown de Yokohama, fica o Templo de
Kanteibyo, de 1873, que é dedicado a Kwandi, cultuado como um deus da
guerra. Mas os japoneses supersticiosos vão na porta do santuário para jogar
uma moedinha e pedir por sucesso financeiro, prosperidade e uma gorda
conta-corrente.
Apesar de possuir a maior população do mundo, hoje na casa de 1,2 bilhão de
pessoas, até antes do processo de abertura da China no fim dos anos 80 era
difícil ver no Japão chineses que não fossem de Hong Kong ou Taiwan.
Agora, eles vêm também de outras partes e começam a ocupar seus espaços. É
possível encontrar diversos jornais e revistas escritos em ideogramas
chineses. Em vários anúncios, há propagandas voltadas exclusivamente para
esse público.