Publicada em 3 de outubro de 2006
O Estado de S. Paulo
Eduardo Nunomura
ENVIADO ESPECIAL
PEIXOTO DE AZEVEDO (MT)
Com a experiência de tocar fogo na mata, arrastar trator para abrir picadas
e caminhar horas pela selva amazônica, Josimar Ferreira, de 33 anos, e seu
colega Silvano Pader, de 24, entraram nos fundos da fazenda Juruna na
direção do avião do vôo 1907. Acharam que podiam chegar lá. Praticamente
impossível, pelo menos por terra.
Com rios tortuosos ou de difícil navegação e uma mata densa, a floresta
amazônica é a maior inimiga para o trabalho das equipes de regaste do vôo
1907. Mesmo se houvesse sobreviventes, eles teriam de cruzar sem orientação
uma selva cheia de obstáculos. Não há água potável. Mateiros só matam a sede
em casos extremos cortando com facões o conhecido cipó d’água. O problema é
que nesta época muitos estão secos.
Caminhar dentro da mata requer senso de orientação que um sobrevivente
dificilmente teria. O aparelho de GPS só funciona em clareiras abertas.
Segue-se, portanto, sob a orientação do sol. O chão é repleto de folhas
secas, que não deixam pegadas claras e escondem buracos. Nem todas as
árvores são nobres, mais fáceis de ser identificadas. Há arbustos e árvores
de pequeno porte com galhos retorcidos. Os espinhos estão por todo lado. E
muitos troncos espalhados completam a flora mais visível. Entre os animais,
onças, cobras e porcos-do-mato.
A reportagem do Estado iniciou uma curta caminhada e constatou o óbvio: a
floresta é quase intransponível. A mata é sufocante, respira-se mal já nos
primeiros metros e a sede é constante. Percorrer um quilômetro leva cerca de
uma hora. De uma fazenda vizinha até o local do acidente, não há menos de 25
quilômetros de mata. Esse foi o principal motivo para a Aeronáutica ter
optado pelo resgate por helicóptero. Para abrir uma clareira, com 30 homens
bem-equipados, levou-se mais de um dia.
Na sexta-feira, Ferreira e Pader viram a aeronave rodopiar duas vezes,
balançando violentamente de um lado para o outro e lançando um grande rastro
de fumaça branca no ar, até desaparecer floresta adentro. Eles fazem
serviços gerais na fazenda Juruna, que fica a cerca de 25 quilômetros, em
linha reta, do local do acidente. A base de apoio da Aeronáutica foi montada
na fazenda Jarinã, a 40 quilômetros da queda, por ter mais estrutura.
“Quando vi (o avião), ele já estava soltando fumaça branca e caindo rápido”,
disse Ferreira. “Ele deu duas piruetas e já estava bem baixo quando varou na
mata”, acrescentou Pader. Eles foram ouvidos por dois peritos da
Aeronáutica, anteontem, interessados em saber qual foi a rota final do vôo
1907.