Publicada em 14 de dezembro de 2006
O Estado de S. Paulo
Eduardo Nunomura
Governador reeleito de Mato Grosso, Blairo Maggi (sem partido) está entre a
cruz e a espada. Ou dá um passo firme para defender o ambiente ou entra na
história como o inimigo da Floresta Amazônica em pé. A vantagem é que essa
decisão só depende dele, um dos maiores plantadores de soja do mundo.
Projeto de lei, à espera de sua sanção ou seu veto, prevê a redução do
Parque Estadual Cristalino em 27 mil hectares – ou quase 27 mil campos de
futebol.
O Parque Estadual Cristalino tem uma área de 184.900 hectares e foi criado
em 2000. Desde então, opôs ambientalistas contra políticos e fazendeiros
interessados em expandir a fronteira agrícola no norte de Mato Grosso. Por
mais de uma vez, propostas de redução do parque foram discutidas, mas
nenhuma prosperou. O temor dos que defendem a sua manutenção é a de que
Maggi pode pender desta vez em favor dos fazendeiros. “É o processo
clássico: desmata, bota o gado, começa a valorização da terra e termina com
a entrada da soja”, criticou o coordenador do Instituto Centro da Vida,
Sergio Henrique Guimarães.
A atual briga começou na semana passada. Deputados estaduais aprovaram um
substitutivo a um projeto de lei do Executivo, que também previa a redução
do parque, mas para uma área em torno de 4 mil hectares. Englobaria
ocupações anteriores à sua criação, como propriedades rurais dos municípios
de Alta Floresta e Novo Mundo. Os parlamentares foram além. Incluíram outras
áreas ocupadas posteriormente, segundo ambientalistas, previram indenizações
para fazendeiros que deverão sair e obrigarão o governo a manter uma estrada
no interior do parque.
“A decisão da Assembléia Legislativa só corrigiu essas irregularidades, uma
vez que o parque foi criado sobre áreas já ocupadas antes”, afirmou o atual
presidente da casa, Silval Barbosa (PMDB). “Com isso, adequamos o parque à
lei e evitamos injustiças e possíveis ações judiciais.” Ambientalistas
discordam e, por meio de imagens de satélites, mostram que grande parte
dessa ocupação ocorreu após a criação do parque (veja mapa acima).
Ao lado dos ambientalistas está o secretário do Meio Ambiente, Marcos
Henrique Machado. Ele foi taxativo. “Minha posição é pelo veto total”,
declarou. “Enquanto os órgãos públicos (Ibama e Fundação Estadual do Meio
Ambiente) não se entendiam, e isso persistiu por mais de dois anos, os
oportunistas de plantão entraram ou aumentaram suas posses.” A secretaria
chegou a aplicar multas para desmatamentos superiores a 5 mil hectares
ocorridos em 2002 e 2003.
Até segunda-feira, Marcos Machado deve entregar um parecer técnico para o
governador. Espera que Maggi siga sua orientação. Promotor de Justiça, ele
não continuará no cargo em 2007. Já o deputado Silval Barbosa se tornará
vice-governador, uma vez que foi eleito na chapa da reeleição de Maggi.
O parque tem cinco ecossistemas ainda intactos: a floresta de terra firme,
floresta estacional, igapó, varjões e afloramentos rochosos. Tem ainda uma
rica porção de terra na transição do cerrado para a floresta amazônica. Tem
mais de 550 espécies de aves, dezenas delas que só habitam a região. Se
tiver sua área reduzida, como pretendem os deputados estaduais, a Serra do
Rochedo e florestas ficarão vulneráveis. A nascente do Rio Nhandu também –
estudo indica que as bacias hidrográficas mato-grossenses já perderam até
43% de sua cobertura vegetal original.
Atualmente, o parque está incluído no programa Áreas Protegidas da Amazônia.
Se tiver sua área reduzida, só o Cristalino pode perder investimentos do
governo federal. Algo da ordem de R$ 3,6 milhões.