Publicada em 10 de setembro de 1997
O Estado de S. Paulo
EDUARDO NUNOMURA
Terminou de forma trágica o drama da família Ota. Depois de dez dias desde que
fora seqüestrado, o menino Yves Yoshiaki Ota, de 8 anos, foi encontrado
anteontem à noite enterrado debaixo de um berço, em uma casa na zona leste.
Dois policiais militares e um vigia acusados do crime foram presos. Durante
esse tempo e já com a criança morta, com dois tiros no rosto, os seqüestradores
mantiveram vivas as esperanças dos pais e negociaram o resgate.
Um dos policiais militares, Paulo de Tarso Dantas, de 34 anos, trabalhava havia
seis anos como segurança particular de uma das empresas do pai de Yves, o
comerciante Masataka Ota, de 41 anos. Dantas é considerado pela polícia como o
mentor do crime, pois conhecia bem os hábitos da família. Chegou a prestar
solidariedade ao pai, depois de ter levado o menino.
“Perdi a confiança na PM, a polícia tem de ser uma só”, afirmou ontem o pai,
durante o velório do filho. Num desabafo emocionado, Masataka Ota chegou a
pedir pena de morte para os criminosos.
O corpo de Yves havia sido enterrado na casa do vigia Silvio da Costa Batista,
na Rua Serra de Santa Marta, 12A, na Vila Carmosina, zona leste. A casa fica a
400 metros de um dos depósitos de materiais do comerciante Masataka Ota. Foi
Batista quem seqüestrou o garoto na tarde de 29 de agosto, levando flores e uma
caixa de bombom para a sobrinha do comerciante.
Flores e bombons – O crime foi premeditado, segundo a polícia. Alguns dias
antes, outro buquê e caixa de bombons haviam sido entregues. Na ocasião, porém,
eles não conseguiram levar o garoto, porque os presentes puderam ser recebidos
pela empregada sem abrir o portão.
Na segunda tentativa, no dia 29, levaram caixas maiores. Nesse dia, o vigia
Batista conseguiu dominar a empregada, que estava na casa com Yves e um primo
dele. Segundo os parentes, o vigia foi logo perguntando quem era o filho do
comerciante. Batista tinha cobertura do policial Dantas, que lhe emprestou uma
pistola 380 milímetros. Eles fugiram no Monza do vigia. Vizinhos notaram que
algo estranho havia ocorrido quando viram o portão do sobrado aberto e o
cachorro solto na rua.
Na manhã do dia seguinte, um sábado, os seqüestradores fizeram um primeiro
contato com o pai de Yves. Pediram R$ 800 mil. Na segunda-feira, o telefone da
casa foi grampeado pela polícia. Nesse dia, o policial Dantas chegou a passar
na frente da casa fardado. Mostrou-se solidário com a família.
Houve duas outras negociações. O valor do resgate caiu para R$ 150 mil e
depois, para R$ 80 mil. O pai chegou a pedir uma prova de que Yves estava vivo.
Os seqüestradores só informaram a idade do garoto e sua data de nascimento.
Segundo o titular da Delegacia Especializada Anti-Seqüestro (Deas), delegado
Maurício Guimarães Soares, é provável que Yves tenha sido morto ainda no dia do
seqüestro.
Na quinta-feira, investigadores da Deas viram Dantas na frente da porta da casa
da avó de Yves, que mora a poucos metros da família Ota. O pai do comerciante
confirmou que conhecia o militar.
No dia 6, os policiais civis chegaram até o vigia Batista, que confessou o
seqüestro e informou que os policiais Dantas e Sérgio Eduardo Pereira de Souza
também teriam participado do crime. Batista foi preso no Departamento de
Investigações contra Crimes Patrimoniais (Depatri).
Presos em flagrante – Os dois policiais negaram o crime, mas foram presos em
flagrante e levados para o Presídio Romão Gomes, exclusivo para policiais
militares. Anteontem à noite, a polícia foi à casa de Batista, onde o menino
Yves tinha sido enterrado com cal, embaixo do berço da filha de 2 anos e 6
meses do vigia. A mulher e a filha de Batista não estavam na casa. Ela está
sendo investigada por policiais da Deas.
Os policiais militares e o vigia serão indiciados por crime de extorsão
mediante seqüestro, seguido de morte. A pena deve ser superior a 30 anos.
O enterro de Ives ocorreu ontem à tarde, no Cemitério do Araçá, e foi marcado
por muita revolta (leia na página 6). Cerca de 300 pessoas foram ao local.