Grupo faz mapa da biodiversidade paulista

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Publicada em 12 de fevereiro de 2002
O Estado de S. Paulo

EDUARDO NUNOMURA
Qual o tamanho da biodiversidade de São Paulo? Centenas de pesquisadores
saem todos os dias a campo para tentar responder a essa questão. Há décadas
fazem isso. A novidade não reside aí, mas no fato de que hoje o conhecimento
por eles produzido está se transformando num imenso e valioso catálogo de
espécies animais e vegetais do Estado paulista. No mês que vem, o
Biota-Fapesp completa seus três anos de vida e os resultados que já surgem
mostram o grande potencial desse ambicioso programa.
A proposta do Biota-Fapesp é singularmente simples: mapear e analisar o
maior número de dados sobre a biodiversidade paulista. Na teoria, é algo que
já poderia existir anos atrás se as milhares de pesquisas feitas no passado
não fossem tão dispersas em cada universidade, instituto e centro de
pesquisa, organizações não-governamentais e governo. Na prática, faltavam
meios, a Internet, e a vontade de cientistas em unificar seus estudos e
descobertas. “Havia um claro de informações disponíveis”, lembra Carlos
Alfredo Joly, professor de ecologia da Universidade Estadual de Campinas e
coordenador do programa.
No armário – Pesquisa de qualidade sempre foi feita no Brasil, mas os seus
resultados muitas vezes ficavam perdidos numa cópia de dissertação de
mestrado ou tese de doutorado trancada num armário de um departamento de uma
universidade. Agora, qualquer estudante paulista ou de outra parte do
planeta pode recorrer ao site www.biota.org.br e descobrir, por exemplo,
onde ocorrem em São Paulo as angiospermas – no caso, as plantas mais
abundantes do País.
“Certa vez, um cientista decidiu pesquisar uma aranha da nossa região. Nunca
tivemos acesso a esses dados. Tudo o que ele descobriu deve estar nos anais
das teses da USP”, diz Cristina Oka, diretora do departamento de turismo da
prefeitura de Cotia. Hoje, ela só tem elogios a outros pesquisadores que
participam de um projeto temático do Biota-Fapesp na Reserva do Morro
Grande. “Estamos tendo uma troca de informações muito grande e descobrindo o
porquê de preservarmos essa área.”
A reserva faz parte do cinturão verde da Região Metropolitana de São Paulo,
no seu lado oeste, com 10 mil hectares de mata atlântica ainda preservada e
pouco estudada. Ela é de propriedade da Companhia de Saneamento Básico
(Sabesp) e compõe um dos reservatórios de água que abastecem a capital.
Coordenados por Jean Paul Metzger, da Universidade de São Paulo, os
pesquisadores estão levantando dados sobre aves, borboletas, mamíferos e
plantas da reserva. “Estamos estudando se há perda da diversidade genética
da população de animais com a redução de áreas de mata atlântica”, diz
Metzger, exemplificando uma das correntes do projeto.
Além disso, os pesquisadores já se propuseram a interagir com a comunidade
do entorno da reserva. Um dos primeiros produtos será uma cartilha ambiental
para alunos da rede pública municipal de Cotia sobre a importância da
biodiversidade local.
Palmeira – Na região, já foi descoberta uma espécie de palmeira peculiar,
cuja folha é prateada e tem alto valor paisagístico. Logo, é um alvo fácil
do predador homem. Palmiteiros e os loteamentos vizinhos também são uma
ameaça à reserva.
Essa interação é o maior valor do Biota-Fapesp. O programa foi criado em
março de 1999, a partir da iniciativa dos pesquisadores que procuraram anos
antes a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) com a
proposta de criar esse banco de dados ambiental.
Nesses três anos, foi possível atualizar a base cartográfica do Estado, que
permite a qualquer cientista incluir os dados de sua pesquisa em andamento.
Hoje, os integrantes do programa vão a campo com o aparelho GPS (que dá
coordenadas precisas de uma localidade) e descrevem numa ficha de coleta os
dados das espécies encontradas e o ecossistema. Tudo vai para a Internet.
Na véspera de completar três anos, o Biota-Fapesp possui 40 projetos
temáticos e mais de 500 pesquisadores, o dobro do seu início. Há outros 25
projetos e auxílios à pesquisa em análise. É um programa que vai durar, pelo
menos, dez anos e teve um custo inicial de R$ 10 milhões. “Quando
completarmos cinco, vamos ter capacidade de fazer uma série de sínteses que
mostrarão as áreas de importância para conservação no Estado”, avalia Joly.
A meta é um inventário das espécies de São Paulo? “Isso é utópico. Mas o que
vamos conseguir fazer é sair do potencial e ir para o real. A biodiversidade
é riquíssima e precisamos usar melhor esses recursos”, responde.

Internet armazena todas as informações do programa
O programa Biota-Fapesp tem o subtítulo de Instituto Virtual da
Biodiversidade. Nada mais propício para um sistema que funciona graças à
Internet. É na rede mundial de computadores que os gigabytes (bilhões de
caracteres) de informações da biodiversidade paulista vão ganhando forma e
conteúdo. A sua base começou com a publicação, em 1997, de uma série de sete
livros com o que se sabia até então de dados ambientais do Estado. Hoje,
além do banco de dados, o SinBiota, há um atlas eletrônico de São Paulo e a
revista on-line Biota Neotropica.
“Todos os projetos associados ao Biota-Fapesp já seguem essa padronização”,
explica o biólogo Carlos Alfredo Joly, coordenador do programa e presidente
do conselho do Centro de Referência em Informação Ambiental, instituição que
administrará o banco de dados. “Ele é único e não existe similar no mundo.”
Uma das metas é integrar o banco de dados de São Paulo com o Species
Analyst, da Universidade do Kansas, um sistema mundial que já reúne coleções
com cerca de 50 milhões de registros da ocorrência da fauna e flora dos
Estados Unidos e Europa.
Como é um programa que conta com a participação de dezenas de cientistas
graduados, a avaliação exigida pela Fapesp é feita por analistas
estrangeiros. A julgar pelo retorno deles, terá vida longa. “Um programa de
sucesso como o Biota-Fapesp é de causar inveja a biológos de todo o mundo”,
elogiou James Stanley, da Universidade de Washington. “O programa Biota é um
exemplo que muitos países deveriam ficar orgulhosos de segui-lo”,
acrescentou o pesquisador australiano Arthur Chapman, também do Comitê
Internacional de Avaliação.

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