Em Foz, comunidade está otimista com Hamas

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Publicada em 28 de fevereiro de 2006
O Estado de S. Paulo

Eduardo Nunomura
FOZ DO IGUAÇU
Um dia acaba, só não se sabe quando. É com essa convicção que o palestino
Mohamed Hassan tenta dissipar a raiva que sente de israelenses quando pensa
na morte de três sobrinhos. Combatentes de grupos radicais, eles morreram em
confrontos com soldados de Israel nos últimos anos. Fazem parte da legião de
jovens anônimos mortos, dos dois lados dessa história. “Toda vez me revolto,
mas no exterior não podemos fazer nada”, desabafa Hassan, um próspero
comerciante de Foz do Iguaçu. Hassan, de 60 anos, é vice-presidente da
Sociedade Árabe Palestina Brasileira em Foz do Iguaçu. Com quatro décadas de
Brasil, costuma ser chamado de André, até mesmo pelos árabes e vê o governo
do Hamas como uma etapa possível para que os palestinos recuperem
territórios. Os palestinos de Foz preferem a discrição para falar do Hamas.
O silêncio se faz necessário dentro de uma colônia árabe diversas vezes
tratada como protetora e financiadora de movimentos terroristas. “Na
comunidade, não faz diferença se a pessoa é Fatah ou Hamas”, afirma Hassan.
É mais fácil encontrar em Foz do Iguaçu partidários e defensores da Fatah, o
partido criado por Yasser Arafat. Mas mesmo entre eles a vitória do Hamas
não surpreendeu. Muitos até trocariam de lado. “Sou Fatah, mas se pudesse
votaria no Hamas”, diz o comerciante Youssef Abu Ali, de 38 anos. Membro do
partido perdedor, torce para que os adversários não enveredem para a
corrupção. A tríplice fronteira com o Paraguai e a Argentina começou a
receber árabes muçulmanos, a maioria de origem libanesa, a partir dos anos
1950. No lado brasileiro, estima-se que vivam 12 mil. Muitos moram na
cidade, mas trabalham em Ciudad del Este, donos de lojas de
eletroeletrônicos. Outros mantêm lojas de calçados e roupas do lado
brasileiro da Ponte da Amizade. Os palestinos são um dos menores grupos,
cerca de 200. A maioria veio há 10, 20 anos. Mas não se desligaram de seus
parentes, que permaneceram no Oriente Médio. Ligam para eles quase todas as
semanas, enviam dezenas de milhões de dólares por ano, ajudam no vaivém de
árabes entre o Oriente Médio e o Brasil. Ligações tão estreitas que fazem
com que boatos sejam encarados como verdades. Quando o comerciante Saiel
Bashar Yahya Al Atary foi preso em junho do ano passado, o jornal paraguaio
ABC Color o destacou como “chefe do Hamas” na tríplice fronteira. O delegado
Igor Romano de Paula, chefe do Núcleo de Migração da Polícia Federal (PF) em
Foz, desmente a relação com o grupo radical. “Apreendemos muito material
dele e não descobrimos nenhum vínculo com terrorismo”, diz. “Não temos
nenhum contato com Hamas, Hezbollah ou qualquer outro grupo armado”,
protesta o xeque Taleb Jomha, da mesquita sunita Omar Ibn Al-Khatab. Segundo
ele, apesar de muitos ainda enviarem dinheiro para parentes no Oriente
Médio, a comunidade é quem está precisando de ajuda. De fato, o aumento da
fiscalização tem levado ao declínio o comércio em Ciudad del Este e há uma
crescente invasão de chineses comprando os negócios das mãos dos árabes. Pai
de cinco filhos, todos nascidos no Brasil, Dawas Aziz, de 53 anos, chegou em
1968. De mascate, virou comerciante e, com a riqueza que produziu aqui, pode
viajar todos os anos para o Oriente Médio. Um de seus filhos, Amir, de 17
anos, não considera a causa palestina como sua. O que faria o pai se Amir
decidisse virar um homem-bomba? A resposta de Aziz é direta: “Ele faz o que
quiser. Antes o único recurso dos palestinos era virar um homem-bomba para
vingar a morte de seu povo. Desta vez, o Hamas preferiu a democracia.”

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